Eu Existo?

Tenho
...
Certidão de Nascimento
(estou vivo)
...
Carteira de Identidade
(sou único)
...
Cadastro de Pessoa Física
(sou de carne e osso)
...
Carteira de Trabalho
(não tenho emprego)
...
Cartão de Crédito
(nome sujo na praça)
...
Cartão de Débito
(Real Universitário)
...
Título de Eleitor
(sou importante)
...
sou gente, existo
...
e pago caro por isto
...
Atestado de óbto: não tem preço!
(por via das dúvidas uso Mastercard)
....
.....
Poema publicado originalmente no site LeiaLivro em 19/08/2005, em que um leitor faz um interessante questionamento que acredito seja ilustrativo constar aqui:
...
Jander Alcântara: Não entendi esse seu "por via das duvidas uso Mastercard", você elogia ou critica? Primeiro decida e depois intensifique, tenho certeza que irá melhorar muito. Mas saiba que você tem muito talento, eu só não poderia era deixar de observar isso. Parabéns!
...
Lucimar Justino: Olá Jander!!! Ao escrever "por via das dúvidas uso Mastercard" na verdade não tive a intenção nem de elogiar nem de criticar. Penso que se há uma determinação do objeto por parte do autor, ou seja, se o sentido é predeterminado, perde-se o prazer do texto que reside exatamente no estranhamento que ele provoca. Mas estive refletindo sobre seu questionamento... acredito que o poema sintetiza nossa sociedade capitalista, consumista. Desde que nascemos somos relacionados como números, estatísticas. E recebemos uma identificação, somos controlados pelo Estado. E ao morrer ainda pagam para que sejamos postos no buraco, para que se dê baixa em nossos identificadores. O último verso pode ser uma síntese dessa vontade de viver que trazemos em nós, dessa vontade de ser, apesar de todas as adversidades, consumidores em potencial. Afinal, numa sociedade de consumo quem não tem dinheiro, quem não tem poder de compra não existe, não é gente... Em suma seria isso, porque essa questão de interpretação é bastante complexa, existem estudos interessantíssimos a respeito. E vale lembrar que a historicidade (conhecimento prévio, convívio social...) do sujeito (leitor) interfere muito na produção de sentido (ou sentidos) de qualquer texto, principalmente o literário. Por fim, muito obrigado pela apreciação e por dizer que tenho talento. Fico feliz. Um abraço!!!

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